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Itamar Soares Veiga aceitou o desafio de escrever sobre um tema relevante: o bilinguismo.




Doutor em Filosofia e professor da Universidade de Caxias do Sul, tem seus estudos focados na metafísica e história da Filosofia, atuando principalmente nos seguintes temas: fenomenologia, Heidegger, hermenêutica, linguagem científica, lógica e matemática.  


(Descrição da foto)
A foto colorida e horizontal mostra Itamar escrevendo. Professor usa camisa verde, paletó e óculos. Com a mão direita segura a caneta e com a mão esquerda apoia seu rosto. 
(Fim da descrição)

A importância da formação de mundo – uma reflexão preliminar sobre o bilinguismo
 
O bilinguismo na língua de sinais nos conduz a reflexões muito interessantes. Existem muitos textos que, além de colocar em pauta o assunto, apontam aos mais diversos caminhos.
Um desses textos é o da Ronice Muller de Quadros (2005). A autora nos traz reflexões muito interessantes sobre o bilinguismo, as quais mostram que o ser humano é efetivamente um “formador mundo”. E nessa tarefa de formar o mundo, os surdos e sua cultura, se colocam perante um esforço político-educacional importante (para detalhes, ver o texto de Ronice).
Recentemente eu tive dois estudantes acadêmicos surdos em uma das minhas disciplinas, tive um contato inicial com o bilinguismo e, pensei que era uma diferença entre duas línguas, mas na realidade, a diferença é muito mais profunda. Pois, se falo português, e depois aprendo alemão ou italiano, ou mesmo inglês, estarei simplesmente sendo multilíngue em um mundo de falantes. Mas, no caso do bilinguismo, da língua de sinais, não temos apenas mais uma língua que se acrescenta, mas um mundo diferente, o mundo dos sinalizantes, que nos é apresentado. Por isso, é estranho pensar sobre a língua portuguesa como a primeira língua dos sinalizantes. Na realidade é o inverso.
Além disso, há outros aspectos fascinantes, nessa plasticidade do humano e os quais são destacados por Ronice: as situações conjugadas, quando uma criança nasce de um ou dos dois pais surdos. Ela, através dos ouvintes que a cuidam, se tornará bilíngue, compreendendo a língua falada e a língua dos sinais, mostrando uma instância viva da interface entre dois mundos: o dos falantes e o dos sinalizantes. Enfim, um mundo compartilhado.
A língua dos sinais e a cultura dos surdos mostram, de forma muito forte, a força humana de formar mundos. Essa capacidade que nos diferencia dos demais animais, encontra no bilinguismo da língua de sinais a instância profunda do compartilhamento do mundo. O maior desenvolvimento nessa direção deve reforçar a busca por uma existência mais justa e mais digna.
Como conclusão final, deixo esses quatro versos abaixo, os quais podem ainda esconder outras tantas palavras que não foram aqui escritas, pois ficaram presas na crua visibilidade da gramática e na tela de um computador, os seus gestos foram, por enquanto, adiados:

Escrito, sobre escrito, sem escrito.
Texto, pretexto, subtexto.
A imagem de uma letra ainda é uma letra?
Como falaríamos/sinalizaríamos a imagem de uma letra sem as letras das palavras?”

Referência


Postagem: Prof. Dr. Itamar Soares Veiga

Comentários

  1. Professor Itamar, nosso agradecimento pela sua valiosa colaboração!

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  2. Parabéns, Prof. Itamar.
    Excelente reflexão. Marcou-me especialmente a sua citação: "A língua dos sinais e a cultura dos surdos mostram, de forma muito forte, a força humana de formar mundos."

    um grande abraço

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  3. JEAN CARLO ESCRITOR, BOA TARDE, EU IMAGINO QUE, O UNIVERSO CÓSMICO TEM UMA INFINITUDE SERES INTELIIGENTES, QUE, COM CERTEZA SE UTILIZAM DE INFINITAS MANEIRAS DE SE EXPRESSAR, INCLUSIVE POR PALAVRAS TELEPÁTICAMENTE DITAS, PENSEM NISSO. UM ABRAÇO PARA TODOS.

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  4. Obrigada prof Itamar por compartilhar conosco suas reflexões!
    Abraço
    Profa Zita Canuto

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  5. Gostei teu texto foi boa leitura! Jaqueline

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